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Mostrando postagens de outubro, 2010

O ALVIRRUBRO

Até onde vai a paixão por um time de futebol? Depende de cada apaixonado. A de Jeremias com certeza vai bem longe. Alvirrubro doente, Jerê não vive um dia de sua vida sem pensar no Náutico, sem fazer alguma coisa em prol do Náutico, enfim, sem interagir com o time que parece ser a razão de sua vida. Otília, sua noiva, já o conheceu assim, ferrenho torcedor. Mas o que ela não imaginava - ou não queria enxergar - é que essa devoção de Jeremias pelo Timbu fosse incomodá-la tanto. Como tudo são flores no namoro, claro que Otília não se importava com as esquisitices de Jerê em dia de jogo. Dormia com a camisa do time, pisava no chão primeiro com o pé direito, tomava café com a xícara vermelha e branca e passava o dia todo mentalizando a vitória do Náutico até a hora de ir para o estádio. Ritual que se repete todo dia de jogo. Quando o time ganhava, nem para casa voltava, muito menos ia ver a então namorada. Entregava-se aos prazeres do álcool para comemorar orgulhosamente a vitória. Mas

OS PESADELOS

Algo de novo aconteceu, percebia José. Ele não sabia o que ao certo, mas ela estava diferente. Madalena, sua esposa, não era a mesma. Afinal, ela nunca chegava do trabalho depois de José. Seu expediente era menor, seis horas, na digitação em um laboratório. Saía às quatro da tarde. José largava às seis. Mas havia um tempo já que Madalena só aparecia lá pelas oito da noite. "Hora-extra", dizia ela, sempre comentando a enxurrada de laudos que tinha digitado no dia. No começo, José acreditava. Quando os atrasos se tornaram rotina, passou a desconfiar, mas tinha medo de perguntar. A desconfiança ia consumindo-o por dentro. E essa desconfiança tinha se transformado em pesadelos. Todas as noites tinha um, sempre com o mesmo roteiro. Madalena, fazendo jus ao estereótipo do nome, pecava. José entrava em casa sorrateiro, ouvindo barulhos estranhos vindo do quarto. Ora eram gemidos, ora eram gritos abafados como que por um travesseiro. José sentiu um gelo na barriga, o coração desc

A ENCOMENDA

Sara abriu aquela caixa na maior inocência. Nunca imaginava que o conteúdo daquele recipiente fosse influenciar tanto a sua vida. Era uma sexta-feira, final de tarde, lá pelas quatro e meia, quando o carteiro tocou a campainha: - CORREIO! - Gritou o homem. Sara saiu e recebeu o pacote. Entrou em casa como uma criança tivessse recebido um presente. Aquela caixa, mandada via Sedex, estava endereçada a ela. Fazia pelo menos uns dez anos que Sara não recebia uma encomenda especial assim. Foi abrindo. Antes de livrar a caixa do papel de embrulho, Josemar, seu marido, chega do trabalho: - Oi amor! Tudo bem? - Disse ele, dando-lhe um beijo, como sempre. - Tudo! Olha só o que mandaram para mim! - O que é isso? - Não sei! Vamos saber agora! Veio por Sedex, o carteiro trouxe aqui ainda agora. Josemar olhou a caixa e viu o endereço do remetente: - Paraná? - Estranhou ele. - Pois é, do Paraná! Não tem o nome de ninguém, só caixa postal. Vai ver é alguma propaganda! - Acho melho

UM MARIDO NO DIVÃ

Antônio estava angustiado na sala de espera do terapeuta. Não via a hora de ser chamado. Seria o próximo da vez, mas os minutos estavam tão longos que mais pareciam horas. Suas mãos, molhadas de suor, denunciavam a aflição daquele pobre homem. Finalmente, a atendente o chama: - Senhor Antônio das Neves! Pode entrar! - Anunciou a secretária. Pernas bambas, respiração ofegante, Antônio entrou na sala, deitou-se no divã e ficou mudo. O dr. Fábio, terapeuta experiente, esperou alguns minutos para que o paciente relaxasse e só então começou a sessão: - Olá senhor Antônio! Como tem passado? - Perguntou o terapeuta. - Mal, doutor! Muito mal! Eu estou sendo traído pela minha mulher e não sei o que fazer! - O senhor já conversou com ela sobre isso? - Deus me livre, doutor! Eu não quero que ela saiba que eu sei! Eu não quero me separar da minha mulher! - Calma! Escute, muitas vezes, num relacionamento, o casal passa por algumas dificuldades, que podem ser várias: falta de diálogo, falta d

TUDO É CARNAVAL!

No começo, tudo é Carnaval! O que o outro diz é como um samba-enredo, que combina direitinho com a nossa escola. O sentimento obedece ao ritmo da bateria. A razão sempre fica em segundo plano, no rabo da escola. É sempre assim o início de um relacionamento. Tudo tem o tempero das mulatas, a leveza da porta-bandeira, a delicadeza do mestre-sala. É nota dez, até que um se acostuma com o outro. Até que se enxerguem os defeitos, as falhas nas alas. Aí entram os nossos jurados internos. Começamos a julgar o outro, a analisá-lo, a compará-lo com desfiles passados. Fulano não tinha isso. Não gosto disso que ele faz, ela é muito chata para tal coisa, e assim vamos desenrolando vários quesitos e tirando pontos, tirando, tirando... Sobra o quê? A realidade. Que está na outra ponta da avenida, na dispersão. Sem alegorias, sem plumas e paetês, sem máscaras, nos resta a massa real. Aquele que sempre esteve ali, mas antes era ofuscado pela eclosão contagiante de sentimentos da nossa escola de sa