Pular para o conteúdo principal

O Réveillon de Juvenal

Festa de gente rico, sabe como é. A gente se sente como que tivesse dez braços e vinte pés. Não sabe onde colocá-los. Eu estava numa dessas na noite de Ano Novo. Roberto, meu amigo, tinha dois convites. Aceitei na hora. Boca livre e do bom e do melhor não é todo dia que aparece pra gente, não é? Foi nessa festa que eu vivi o inacreditável. Nunca imaginei que presenciaria uma cena daquelas. Fiquei chocado. Viviane, a dona da casa, ou melhor, Dona Vivi (os ricos adoram abreviaturas chiques), estava lindíssima. Apesar de quarentona, deixa muita mulher de vinte aninhos "na chõn". Mas, como eu ia falando, a tal da Dona Vivi estava lá, esbanjando charme e simpatia. Eu, pobre Juvenal, só olhando mesmo. Muita areia pro meu caminhão aquela mulher. Mesmo assim, o maridão estava lá. Um fazendeiro de 60 anos, mas de tão acabado parecia ter uns 80. A esposa é uma adolescente perto dele. Mas, sabe como é, dinheiro faz milagres, até fabrica amor!

Claro que passaram um monte de coisas pela minha cabeça. Que aquela mulher devia ter uma meia dúzia de namoradinhos entregadores de pizza, motoboys, sei lá. Só com aquele velho é que ela não ia se contentar. A aí veio a surpresa na hora do brinde. Eu já tinha notado a presença de um homem misterioso, cabelos grisalhos, mas enxutão. Simpático e quando sorria parecia ter cem dentes tamanha era a sua arcada dentária. Nunca imaginei que ia observar a arcada dentária de um homem. Mas lá estava eu. E, de tanto observar, acabei notando que de vez em quando ele olhava de soslaio para Dona Vivi. Olhava um olhar meio malicioso, como quem está verificando algo. Tive receio de olhar para Dona Vivi e ver se ela também correspondia àquele olhar. Vai que o marido dela iria pensar que eu estava paquerando a mulher dele? Mas, com os misteriosos olhares do homem misterioso, minha enorme curiosidade venceu o medo e eu passei também a observar Dona Vivi. E constatei, para minha surpresa, que ela também olhava do mesmo jeito para o tal homem.

Meu amigo Roberto, amigo dos filhos de Dona Vivi, estava entretido conversando com algumas pessoas e eu, ali, sozinho com minhas observações, não tinha com quem dividir o que eu acabara de descobrir: uma traição. Será que eles já são amantes ou estão se apaixonando agora? Essa besteira passou pela minha cabeça. Resolvi relaxar e aproveitar a bebida e a comida. Quando peguei mais uma taça com o garçom, toca no meu ombro uma pessoa. Quando virei, dei de cara com o marido de Dona Vivi, o fazendeiro caquético de 60 anos que mais parece ter 80. Ele sorriu para mim, não um sorriso tão cheio de dentes quanto o amante da mulher dele (é, eu já os considerava amantes), e me disse:

- Relaxa! Esse é só mais um.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

AMOR LONGE

Não tem coisa mais frustrante Do que namorar de longe Um lá e outro aqui Que nem freira e monge Dizem que a distância aumenta No coração a saudade Mas se você tem urgência Tem que sair da cidade Numa situação dessa É aconselhável pensar Viver junto daria certo? Melhor não especular Já diz um velho ditado Quem casa, quer casa Mas nos tempos de hoje Quem casa, descasa! Porém não quero que pensem Que sou contra o casamento Dormir junto é muito bom Mas pode ser só momento Se você não escolher bem Com esse tormento convive E pra quem namora de longe Disso já está livre Mas livre não está Quando a carência bater O jeito é apelar Pra internet resolver Pela web se conversa Por texto, vídeo e áudio Riem, brigam e choram Depois, cada um pro seu lado Mas também é vantagem Viver um amor assim Aparecem outras pessoas Pra aliviar a fase ruim Agora vamos ser justos Não é legal enganar Se alguém é só um escap

A sina da amante

Dizem que ter uma amante É correr perigo constante Que o homem precisa se cuidar Para a esposa não o flagrar Muitos conselhos dão Para aquele que a cerca pula Tudo o homem tem à mão Para se livrar de um safanão Só que todos se esquecem Que aquela que é a outra Leva uma vida difícil Quem pensa que é só alegria Mal pode imaginar Que a coitada da amante Entra é numa grande fria O problema da amante É que ela já tá perdida Ainda na fase de pré-amante Já leva nome de bandida É chamada de vários adjetivos Melhor o significado não saber Mas tem um tão grosseiro Que nem me atrevo a dizer Não se engane quando a amante Enche a boca e diz Que fica com a melhor parte E, dando uma de atriz, Faz todo mundo acreditar Que, sendo a outra, é feliz Na verdade a bichinha É uma grande coitadinha Pensa que está por cima Mas depois que o tempo passa Vê que o tiro saiu pela culatra O cara nem deixa a mulher E também não para de prometer Que a situação deles

José, um homem de fé

José tava de dar dó Sol quente na moleira Na garganta, aquele nó Capinando e pensando Onde estará a minha Filó? Filomena é o nome Da esposa de José Que arrumou outro homem E do sítio deu no pé Mesmo levando o fora Sendo por ela humilhado Virando motivo de chacota José gritou 'tão perdoado' Mas Filó já estava longe Na charrete do amante Nem escutou o apelo Do marido vacilante E então José passou A levar a vida à toa Capinava no sítio Fizesse sol ou garoa Na esperança de um dia Filomena retornar E dizer: 'voltei, José' Ao regaço do nosso lar Mas já diz o ditado Quem come se lambuza E Filomena tem olhos De invejar a Medusa O amante é homem bonito Rico, inteligente e educado Que mulher não o preferiria A um marido aloprado? Quando Filó bateu o olho No seu futuro affair Pensou 'é com esse!' Que daqui eu dou no pé José nem desconfiava Da tempestade que se formava Só tinha olhos pro sítio E pros bois que comprava