O
telefone celular tocava insistentemente. Cinco e quarenta da manhã de um
pleno domingo. Aguinaldo não acreditou. A muito custo levantou-se da cama e foi
pegar o aparelhinho renitente. Na chamada não atendida, um número confidencial.
Fulo da vida, Aguinaldo voltou para a cama e tentou pegar no sono. Em vão. A
memória do chamado telefônico repetia-se em sua mente. O jeito foi levantar e
ferver água para o café. Margarida ia chegar às sete da matina do plantão do hospital.
Ela é uma exímia enfermeira.
Chegou
como sempre faminta. Aguinaldo já tinha feito o café e ovos mexidos, torrado o
pão e fervido o leite. Margô sempre contando as novidades do plantão. Imagine
que aquela madrugada um paciente havia dado entrada na emergência com uma
enguia no abdômen. Uma enguia! Pequena, mas uma enguia. Talvez seja até um
filhote de enguia. A família do azarado disse que foi um acidente. Ela, a
enguia, entrou pelo ânus por um descuido da vítima, ou melhor, do coitado. A
fofoca do plantão dava conta de outra versão... mas tudo bem. Deixemos a enguia
pra lá por enquanto.
E
o telefone de Aguinaldo toca novamente. De novo o número confidencial, mas
desta vez ele conseguiu atender:
-
Alô? Alô! Quem fala?
Ninguém
se pronunciava. Esse fato teria passado despercebido, não fosse essa ligação
ocorrer novamente em dias alternados. Sempre quando Margarida estava para
chegar ou havia acabado de chegar do plantão do hospital. E cheia de novidades.
Imaginem que a história da enguia ainda foi assunto de boca-a-boca durante uns
15 dias. Saiu até em jornal. Um dos médicos, um residente, fez um vídeo da
bichinha saindo do abdômen do paciente e botou na internet. Foi suspenso. Dizem
que pode ser até expulso do hospital. Quando Margarida estava contando esse
capítulo da história da enguia o telefone de Aguinaldo tocou novamente. E
novamente ninguém se identificou ou falou nada. Desligou na cara dele.
Até
que um dia, como sempre tem que chegar o dia da verdade, Margarida está à toda
contando mais uma novidade da enguia famosa, sentada num banquinho enquanto
Aguinaldo tomava banho. O celular dele tocou de novo e desta vez Margarida,
prestativa, atendeu:
-
Aqui é do celular de Aguinaldo. Ele está no banho.
Ficou uns segundos
calada, escutando, e depois continuou:
- Mas eu lhe disse que esse número é do meu marido!
Margarida desligou o
celular e ia continuar a história da enguia, mas não deu. O tempo fechou no
banheiro. Briga de casal é assim: no melhor da festa, a gente tem que sair
senão vira fofoca.
Leusa, eu havia suspeitado isso desde o primeiro parágrafo. O plantão acaba às sete. Não havia condições de ela conseguir chegar no mesmo horário em casa, rsrsrsrs...
ResponderExcluirEssa minha mente plástica é assim... mesmo lendo arte de melhor qualidade, sempre trago as linhas pra vida real!
Pra variar, excelente texto.
Abraço!